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Uma conversa com Joana Cadima & Bárbara Baptista
“E se os livros, em vez de arrumados nas prateleiras dentro de um qualquer edifício, circulassem por aí, soltamente, desafogadamente, estendidos pelo meio das ruas, disponíveis para qualquer pessoa, a convidar à leitura na relva, ou a ouvir uma história, ou a conhecer um fotógrafo, ou um escultor, ou a desenhar ou..., e assim, à mão de semear de qualquer um?”
A conversation with Joana Cadima & Bárbara Baptista
“What if books, instead of being put away in shelves inside some building, would move around, unleashed, freely, in the middle of the street, available to anyone, inviting people to read them on the grass, or to listen to a story, or to get to know a photographer or a sculptor, or to draw or... or, like this, for anyone to pick them up?”
MV – De que pressupostos partiram para a realização da vossa proposta apresentada ao/no concurso de ideias lançado pela MORADAVAGA? Como surgiu esta ideia?
JC + BB - A ideia base era a utilização do espaço público para fins que nos dessem prazer... que aquele servisse para alguma coisa sem ser só para passar, como muitas vezes sucede... que as pessoas pudessem usufruir de um espaço que muitas vezes é tido como de ninguém quando deveria ser entendido, pelo contrário, como um espaço de todos.No que se refere à utilização do livro como veículo para o usufruto de espaços ao ar livre na cidade, esta questão partiu do entendimento do mesmo como algo que não precisa de tanto empenho por parte do leitor ou tempo como por vezes se quer fazer crer... foi também porque era algo próximo de nós, de que gostamos. Desejávamos também torná-lo facilmente acessível a toda a gente de maneira a ajudar a libertar a imaginação de cada um...O objecto “livro” tem várias utilizações possíveis e esta iniciativa desenvolveu-se um pouco à volta da exploração desta ideia: tens a leitura de um romance, que implica uma leitura mais demorada que exige uma elevada concentração, ou apenas a fruição de uma ilustração ou de um pequeno texto de informação, a leitura de um poema, ou a apreciação das próprias características físicas do objecto como a paginação ou os pormenores tipográficos, etc.
MV - On what grounds did you build up the proposal that you presented in the ideas competition launched by Moradavaga? How did you come up with that idea?
JC + BB – The main idea was based on using public spaces in ways that would be pleasant to us... that the public space should be something more than just a place you pass by on your way to somewhere else...that people could enjoy places that are commonly seen as “no man’s land” when, on the contrary, they should be perceived as “places of everyone”.
Regarding the use of the book as a vehicle for the enjoyment of open air spaces in the city, that happened because books are something that we enjoy and we think that reading a book doesn’t necessarily need such a commitment from the reader, as many people seem to believe… We also wished to make them easily accessible to everyone to help people free their imagination.
You may use and enjoy a book in various different ways and our project explored this idea: you can read a novel that catches your full attention and spend some time doing it, or you can simply enjoy a picture or a illustration, or be interested in a small text or a poem, or be delighted with the object itself, with the way that it’s printed, the quality of the materials used in its production, the typographic solutions it makes use of, etcetera.
MV – Como refere o título do vosso projecto, havia quatro pernas (as vossas!), muitos olhos (os dos transeuntes) e cerca de quatro dezenas de livros. Como é que se processou a vossa iniciativa?
JC + BB – No que toca à selecção dos livros, esta tentou ser o mais variada possível. Havia romances, poesia, ensaios, livros infantis, monografias sobre diferentes artistas, pintores, fotógrafos, escultores, livros de fantasia, ficção, livros de contos... livros de várias dimensões, pequenos, médios, grandes, finos, mais grossos, de capa mole e capa dura... Isto tudo para ir ao encontro daquilo que as pessoas pudessem gostar, o que no fundo ia também ao encontro dessas várias facetas de que um livro se pode revestir de que falávamos anteriormente.Para além dos livros tínhamos lápis de cor, papéis e fita adesiva para qualquer “eventualidade”, ou seja, estávamos preparadas para a possibilidade de aparecerem crianças e de, portanto, poder explorar algumas das histórias através do recurso ao desenho, ao recorte ou à colagem. Aliás, no segundo espaço pelo qual passámos/que visitámos, isso veio efectivamente a acontecer.Num pequeno baldio de onde habitualmente se aprecia o tradicional fogo de artifício nas festas de S. João, surgiram algumas crianças que nós convidámos para ouvir uma história...e aquele momento foi o que levou a mais actividades: um grupo de cinco crianças ficou a ouvir-nos ler uma história e, ao mesmo tempo, nós íamos puxando por elas e elas iam interpretando a história através de desenhos, inventaram histórias a partir daquela que ouviram...isto ainda durou algum tempo.
MV – As the title of your project indicates, there were four legs (your own!), many eyes (those of the passers by) and around forty books. How did it worked?
JC +BB – We tried to select a wide variety of books. There were novels, poetry, essays, storybooks, artist’s monographs, fiction, tales… small books, big books, medium sized books, hardcover and paperbacks… We tried to provide the readers with a considerable range of choices and also to express that multitude of elements that a book may contain in it.
Besides the books we also carried coloured pencils, paper and tape to use in case we’d encounter some children that would be willing to explore around some story using drawing or collages. That eventually happened in the second place we visited. In a vacant piece of land from where people usually enjoy the fireworks in S. João (a traditional summer commemoration) some children walked by and we invited them to hear a story… and that moment was the one that lead to the realization of more activities: a group of five sat listening while we told them a story and, at the same time, they tried to interpret the story by means of drawing and by inventing other stories…
MV – Em que outros sítios é que “actuaram”?/intervieram?
JC + BB – Começámos pelo Passeio das Virtudes, depois fomos para o já referido baldio ao fundo da Rua de S. Bento da Vitória e, por último, passámos pelo jardim do Marquês.
MV – In which other places did you intervene?
JC + BB – We started on Passeio das Virtudes and then went to the vacant plot at the end of Rua de S. Bento da Vitória that we talked about. After that we still had the time to go to Praça do Marquês.
MV – Quais foram as razões por trás da escolha desses sítios?
JC + BB – São sítios dos quais gostamos particularmente... pelas vistas, pelas árvores...são sítios em que há espaço para as pessoas estarem...acima de tudo são sítios especialmente agradáveis da cidade do Porto... chegámos a pensar em mais sítios, mas não tivemos tempo suficiente...depois de termos ido ao Marquês ainda ponderámos acerca de ir a outro local mas depois estava a cair o sol e...
MV – What were the reasons for choosing those places?
JC + BB – These are places that we particularly like… the views, the trees… these are places that have enough space for people to stay and sit… above all these spaces are some of the many pleasant spaces in Porto… we thought of going to other places but we didn’t have enough time… after Marquês the sun was already setting and…
MV – Portanto isto foi realizado num único dia...
JC + BB – Sim...talvez pudéssemos ter estado mais tempo em cada sítio...mas como queríamos experimentá-los todos...
MV – So this was all done in one single day…
JC + BB – Yes… maybe we could have stayed longer in each place… but we wanted to try them all…
MV – O sistema que encontraram para expor os livros é deveras insólito! Como é que chegaram àquela solução de os apresentar às pessoas, assim, pendurados?/ How did you come up with the idea of hanging the books?
JC + BB – Porque os estendais com roupa pendurada constituem, em nosso entender, uma das imagens fortes da cidade do Porto. Agrada-nos a espontaneidade da roupa pendurada, muitas vezes em espaço comum, público, de uma forma muito natural... E os livros, à semelhança das roupas, são muito coloridos, muito variados, e, como nós pretendíamos que a nossa iniciativa se pautasse pela simplicidade e pela naturalidade, optámos por este processo, algo poético, de apresentá-los às pessoas.
MV – The way you presented the books was particularly clever! How did you come up with the idea of hanging them on a rope?
JC + BB – In our view, the image of clothes hanged to dry in the streets and in the facades of the buildings are one of the trade marks of Porto’s old neighbourhoods. We like the spontaneity of people hanging clothes in the public space, in a very natural way… Books, like clothes, are colourful and vary in size, and, as we wanted our project to be very simple and natural and to use as few resources as we could, we decided to use this technique in a somewhat poetic way.
MV – Poder-se-á inferir, do que disseram até agora, que aquilo que vocês defendem é que os espaços e as pessoas estão “lá” e o que é necessário é fornecer/providenciar funções de “animação”?
JC + BB – Funções prazenteiras... que dêem prazer, para que as pessoas não passem apenas, para que lhes seja dada oportunidade de permanecer. Neste caso foram livros, mas poderiam ser outras coisas... aquele projecto “se esta rua fosse minha...” foi fantástico! Seria de repetir, principalmente em dias de sol!Há uma geração de pessoas mais velhas que ainda vai utilizando os espaços, reúnem-se, jogam às cartas... algumas crianças também, mas cada vez menos. De resto, pouca gente de idades intermédias parece utilizar a rua... embora agora, com a nova lei do tabaco, se note que começa a acontecer uma maior utilização das ruas... (risos)Se os espaços fossem tornados mais convidativos... Ou seja, não queremos de maneira alguma defender que a responsabilidade para tornar os espaços públicos agradáveis é unicamente das pessoas. As câmaras municipais têm um papel muito importante, tanto na qualidade dos espaços, como no apoio a iniciativas de animação das ruas.O Marquês, por exemplo, era um espaço escuro e desconfortável, mas desde a intervenção para instalação do Metro há famílias que passeiam descansadamente às onze da noite! Ao invés, a Praça dos Poveiros é um deserto... ou a rotunda da Boavista que é um espaço com potencial mas que não tem funções atraentes... serve só de passagem.Mas acreditamos também que as pessoas podem apropriar-se do espaço e utilizá-lo de maneiras muito diversas. A partir do momento em que o espaço é percebido como sendo de todos pensamos que as coisas mudam de figura... como o caso das crianças que jogam e brincam em frente ao Centro Português de Fotografia, apropriando-se espontaneamente do espaço.
MV – May one infer, from what you’ve said until now, that what you believe is that the people and the spaces are there and that it’s just necessary to provide some kind of activity or function to make it happen?
JC + BB – Pleasant activities… ones that are pleasurable so that people don’t just pass through but also feel compelled to remain in a public place. In this case it was the books, but it could have been something else… the event “se esta rua fosse minha…” (“if this street was mine…”) was fantastic! There should be more of that kind, especially in sunny days!
There is an older generation of people that still uses public space to play cards and things like that… there are also some children that play football on the street, but their number is decreasing. But as far as intermediate generations are concerned there appears to be little use of public space… now with the new anti smoking law, we’re starting to see a more intensive use of the streets… (laughs)
Maybe if the places were more inviting… with this we’re trying to say that the responsibility of transforming these spaces doesn’t lie only on the people’s side. The public authorities have a major role in the design of the spaces as well as in supporting their animation.
Marquês, for example, was a dark and uncomfortable place but nowadays, since the intervention of the Metro, there are families that walk around at 11p.m.! On the other hand, Praça dos Poveiros is a desert… or Rotunda da Boavista, which is a space with lots of potential but that has no attractive functions… only a place to pass by.
Nevertheless we believe that people have the possibility of using the space in multiple ways. If people would see the public space as belonging to everyone, we would start to think in a different way… one example would be the kids playing soccer in front of Centro Português de Fotografia – they had putt beacons! – appropriating the space spontaneously.
MV – Gostaram do resultado da vossa iniciativa?
JC + BB – Quando terminámos o projecto estávamos todas entusiasmadas! Os miúdos e o resto das pessoas, foram impecáveis! Foi muito fixe!Acho que o (grande) valor da ideia foi ter sido posta em prática...porque de resto ela não tem nada de muito elaborado, é realmente muito simples... e, mesmo com grande simplicidade de meios, conseguiu-se criar algo que por breves momentos envolveu as pessoas e aí reside todo o valor...Aquilo que nos surpreendeu foi a curiosidade manifestada pelas pessoas a partir do momento em que se colocaram os livros...as pessoas aproximavam-se de imediato para perceber do que se tratava...
MV – Did you like the results of your work?
JC + BB – We were very excited when we finished the project. The kids and the rest of the people, they were great! It was really cool!
I think that one of the major advantages of this project was that it really happened … because the idea is not elaborate, it is really simple… and, even with its simplicity, for a few moments, people were really involved and that’s where its value lied… the curiosity of the people looking at the books was surprising… people tried to reach the books instinctively just to see what was happening…
MV – De que meios é que necessitariam para implementar algo deste género?
JC + BB – ter mais materiais para poder dar às pessoas... neste caso nós utilizámos os nossos próprios livros... gostaríamos de ter dado livros às pessoas, às crianças... pôr as pessoas a fazerem livros, serem elas próprias a criarem livros, por exemplo... a parte fixe foi nós conhecermos os livros e podermos explicá-los e mostrá-los às pessoas... estava a pensar que com a música podia-se fazer a mesma coisa, troca de experiências, partilha... um pouco à semelhança do que acontece com os amigos quando descobrimos algo e lhes damos a conhecer...
MV – What kind of means would you need to have to implement something similar?
JC + BB – To have more materials to be able to give them to people… in this project, we used our own books… we would like to give books to people, to the children… another idea that we could try in a newer initiative would be to encourage people to make their own books… one of the coolest parts of this project regards our own knowledge of the books that we were carrying. We then could explain and show them to people… I was thinking that we could do the same with music, share our knowledge, the things we like and explain why we like it… the same happens between friends, when we discover something new and we want to share it with them….
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